
Namoro
Mandei-lhe uma carta em papel perfumado
e com a letra bonita eu disse ela tinha
um sorrir luminoso tão quente e gaiato
como o sol de Novembro brincando de artista nas acácias floridas
espalhando diamantes na fímbria do mar
e dando calor ao sumo das mangas.
Sua pele macia – era sumaúma…
Sua pele macia, da cor do jambo, cheirando a rosas
tão rijo e tão doce – como o maboque…
Seu seios laranjas – laranjas do Loge
seus dentes… – marfim…
Mandei-lhe uma carta
e ela disse que não.
Mandei-lhe um cartão
que o Maninjo tipografou:
“Por ti sofre o meu coração”
Num canto – SIM, noutro canto – NÃO
E ela o canto do NÃO dobrou.
Mandei-lhe um recado pela Zefa do Sete
pedindo rogando de joelhos no chão
pela Senhora do Cabo, pela Santa Ifigénia,
me desse a ventura do seu namoro…
E ela disse que não.
Levei à avó Chica, quimbanda de fama
a areia da marca que o seu pé deixou
para que fizesse um feitiço forte e seguro
que nela nascesse um amor como o meu…
E o feitiço falhou.
Esperei-a de tarde, à porta da fábrica,
ofertei-lhe um colar e um anel e um broche,
paguei-lhe doces na calçada da Missão,
ficamos num banco do largo da Estátua,
afaguei-lhe as mãos…
falei-lhe de amor… e ela disse que não.
Andei barbado, sujo, e descalço,
como um monangamba.
Procuraram por mim
” – Não viu…(ai, não viu…?) Não viu Benjamim?”
E perdido me deram no morro da Samba.
E para me distrair
levaram-me ao baile do sô Januário
mas ela lá estava num canto a rir
contando o meu caso às moças mais lindas do Bairro Operário
Tocaram uma rumba dancei com ela
e num passo maluco voamos na sala
qual uma estrela riscando o céu!
E a malta gritou: “Aí Benjamim!”
Olhei-a nos olhos – sorriu para mim
pedi-lhe um beijo – e ela disse que sim.
Viriato da Cruz nasceu em Porto Amboim, Angola, em 1928. Poeta, foi um principais mentores do Movimento dos Novos Intelectuais de Angola e da revista Mensagem. Saiu de Angola em 1957 com destino a Paris e ao encontro de um intelectual angolano, Mário Pinto de Andrade. Foi fundador e primeiro secretário-geral do MPLA, movimento de que veio a ser expulso em 1963, por dissidências com Agostinho Neto. Radicado em Pequim a partir de 1966, distancia-se do regime maoísta, que o impede de abandonar a China e relega a um campo de trabalho, degradação e fome, onde veio a morrer em 1973.

Este Namoro, musicado por Fausto, foi cantado por Sérgio Godinho no disco “De Pequenino se Torce o Destino” de 1976.
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