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À Pala de Walsh

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Vagueando pelo grande universo da Fotografia, trago hoje uma referência à imagem em movimento.

À Pala de Walsh é, para além do inspiradíssimo nome, uma preciosidade para cinéfilos. Um blogue de cinema, sobre cinema e para cinema. Um blogue para ver, lendo.

À Pala de Walsh, em exibição num computador perto de si, com produção e realização de –

Carlos Natálio, João Lameira, Luís Mendonça e Ricardo Vieira Lisboa

Alguém disse que escrever sobre música é como dançar sobre arquitectura. Escrever sobre cinema não é tarefa menos absurda. Construir um texto, palavra sobre palavra, acerca de mortos que vemos bem vivos, de estranhos que vemos chorar diante de nós e se riem do outro lado do mundo, de olhos que não vemos de todo (mas sabemos estarem por trás daquilo tudo). De passados que nunca foram e futuros que nunca hão-de vir, presentes enganosos. Mais vale contar números e estrelinhas, coleccionar trailers e as novidades de ontem. Nós não. Cometemos a imprudência dos que esculpem sobre teatro e pintam sobre literatura. Escrevemos sobre cinema.

O nome do site é uma homenagem àqueles que descobriram autores nos corredores dos estúdios de antanho (hoje armazéns de recordações). Aos nomes que reconhecemos dos genéricos da Warner Bros., da Paramount, da 20th Century Fox, da RKO, da MGM. A Raoul, o cineasta dos mil géneros que um acidente de carro (antes de uma rodagem) deixou zarolho. À pala de Walsh.

O filme do blogue passa assim –

Críticas
Em Sala — A actualidade cinematográfica em cartaz.
Noutras Salas — Filmes que não vão estrear numa sala perto de si.
Recuperados — Viu demasiado rápido? Filmes que valem a pena ser revistos com olhos de ver.
Raridades — Análise a obras de difícil acesso que ajudam a expandir o seu conhecimento cinéfilo.

Contra-campo
Exercícios chanfrados de cinefilia a várias mãos.

Sopa de Planos
Todos os meses, a pretexto de um tema, cada um dos membros do “À pala de Walsh” escolhe um plano que o ilustra.

Cadáver Esquisito
Exercícios ensaísticos à boa maneira surrealista. Um tema e quem escreve a seguir “improvisa” com base no que foi escrito antes.

Actualidades
Num exercício de diálogo entre o cinema e o real, pomos todo os meses, lado a lado, os eventos mais marcantes da actualidade mundial e filmes que já nos mostraram o que aconteceu.

Filme Falado
Mensalmente os nossos leitores elegem um filme e o “À pala de Walsh” vê-o e discute-o em conjunto. O hilariante resultado é para ser ouvido num breve podcast.

Crónicas
Em Série — Crónica assinada por João Lameira sobre a universo das séries de televisão.

Movimento Perpétuo — Recordações de infância ou o crescimento de alguém através do cinema. É esse o olhar intimista que nos propõe Francisco Valente na sua crónica.

Filmado Tangente — Números, análises de mercado e de bilheteira nacionais, a saúde do cinema português, passa tudo por esta imprescindível crónica de Ricardo Vieira Lisboa.

Civic TV — O que ver na TV? Qual o seu papel na relação com o cinema? Luís Mendonça dá uma ajuda todos os meses.

Simulacros — O valor da imagem, olhar para ela, ver o que lá está e o que lhe falta. É esse o propósito da crónica só por imagens de José Bértolo.

Ecstasy of Gold — Num tom único e irreverente, Tiago Ribeiro propõe-nos um abordagem nada convencional da música e som no cinema.

Em Foco — Temas em destaque no mundo do cinema.

Dossier — Conjunto de artigos de fundo dedicados a um tema ou cineasta.

Entrevistas — Conversas com cinema lá dentro.

Acção! — Espaço de causas e manifestos.

A Livreira Anarquista

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O Mundo está melhor !
A Livreira Anarquista voltou !

Muammar al-Gaddafi

Caminhos da vida levaram-me a Tripoli um par de vezes antes da Revolução, ou seja durante a fase terminal do regime de Gaddafi. Encontrei uma cidade incaracterística, em transição, no cruzamento de vários estilos e influências.

Os pontos de destaque eram a bela orla Mediterrânica por onde se estende a cidade, o arco romano de Marco Aurélio, a incontornável Praça Verde e a Medina, com um souk vibrante. Fora estes, havia, claro, o gigantesco complexo residencial, administrativo, político e militar de Gaddafi, uma extensão enorme, murada, vigiada e defendida militarmente, dentro da cidade. A circulação em volta do complexo era fortemente restrita e controlada, os carros não podiam parar, fotografias, nem pensar.

Há uns meses atrás, já bem depois da Revolução, voltei a Tripoli. A cidade tinha já retomado o seu ritmo normal, agora marcado pela presença das, várias, milícias, vendo-se gente – especialmente jovens – carregando armas de guerra.

Estranhamente, para mim, dada a violência dos bombardeamentos e a duração dos combates, a arquitectura da cidade, na sua parte residencial e comercial, estava praticamente intacta. Umas marcas de impacto de balas aqui e ali, mas nada que pudesse prenunciar o conflito recente.

A parte militar, contudo, contava outra história. Quartéis e instalações militares completamente destruídos pelos bombardeamentos durante o conflito e, terminado este, pela fúria popular. A precisão cirurgica dos bombardeamentos é impressionante, chegando ao ponto de os muros exteriores permanecerem de pé, enquanto que o interior tinha praticamente desaparecido.

Um dos locais onde me foi possível entrar foi o complexo de Gaddafi, fortaleza inexpugnável até à queda. Tornou-se, agora e pela primeira vez, um local de visita dos habitantes da cidade.

Fiz algumas imagens com uma pequena máquina compacta que, apesar de a qualidade não ser brilhante, incluí no meu site, JMPhoto, na página Andanças.

Aqui ficam algumas dessas imagens.

Ano Novo / Ano Velho

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Aqui fica um excerto de “A Campanha Alegre” de Eça de Queiroz que, sob este título reuniu as crónicas publicadas em “As Farpas”, publicação mensal de crítica política, mordaz e satírica, que manteve com Ramalho Ortigão a partir de 1871.

Este texto relata o encontro, em Badajoz, entre o Ano Velho de 1871, a deixar Portugal, e o Ano Novo de 1872, que chegava.

Passaram quase 150 anos … mas o País parece o mesmo.

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Querido público, eis-te diante de um Ano Novo – o ano de 1872. os feiticeiros das Farpas, por grande maravilha o sabemos! Ano Velho e Ano Novo cruzaram-se na fronteira, em Badajoz. O Ano Velho estivera trezentos e sessenta e cinco dias em Portugal; recolhia enfastiado e embrutecido; tinha os dedos queimados do cigarro; levava o estômago estragado da mesa do hotel; ia ressequido da falta de banhos; palitava os dentes com as unhas; sabia ajudar à missa; assoava-se a um lenço vermelho; perguntava a todo o propósito que há de novo? – e era reformista. Estava aportuguesado. Ano Novo, esse, saía da frescura do Céu.

Cumprimentaram-se, risonhamente.

E no silêncio da noite, à sombra dos muros de Elvas, de onde nós escutávamos, palpitou entre os dois, vivo e rápido, este diálogo:

Ano Novo (preparando a carteira e o lápis):

– Este país em que vou entrar é uma monarquia ou uma república?

Ano Velho (gravemente):

– As geografias dizem que é uma monarquia… Pelo que vi pareceu-me que nem era uma monarquia, nem uma república – e que era apenas um chinfrim.

– Mas, Ano Velho, pelo menos há um rei?

– Há um, Ano Novo. Os jornais revelam de vez em quando a sua existência – contando que fora fotografar-se! É quanto se sabe da sua vida pública.

– Mas, esse rei reina?

– Reina – como quando se diz na descrição de uma sala: «no alto, ao pé da cornija, reina um friso dourado…

– E por onde se governa esse país?

– Este país tem a Carta, que se manifesta todos os meses nas músicas regimentais

– em hinos; e actua nas repartições de ano a ano – em suetos… É tudo o que o país sabe dela.

– E de que vive o país? Tem rendimentos, tem orçamento?

– Tem de menos, todos os anos, para pagar as despesas da casa – uns cinco ou seis mil contos. É a isto que eles chamam – as finanças. Cada ministério…

– Um momento! Eu sou um simples, um ingénuo, chego… O que é um ministério?

– É uma colecção de doze homens que se encarregam (seis trotando a cavalo atrás dos outros seis) de governar o País – isto é, de ter a mão na chave da despensa. Quando se pertence a um partido…

– Pertencer a um partido, caro colega, vem a ser?…

– É meter-se a gente num ónibus que leva aos empregos – e a que puxa o chefe do partido, sempre com o freio nos dentes!

– Mas a questão da fazenda, dizia…

– É uma espécie de nó que todos, um por um, são chamados a desatar – e que cada um aperta mais.

– Sem nunca entalar os dedos?

– Bem ao contrário! A alguns fica-lhes na mão o pó da corda. Ora é com esse pó que se compram os melões.

– E o País, em que se emprega?…

– Nas secretarias. São salas onde homens tristes escrevem em papel almaço «Il.mo e Ex. mo Sr.» – para poderem jantar, e ter este acesso: aos 20 anos semi-inúteis, aos 30 inúteis, e aos 45 inúteis e semi.

– E de onde saem esses homens?

– Do liceu, que é um lugar com bancos, onde em rapaz se decoram bocados de livros – para ter o direito de não se tornar a ler um livro inteiro depois de homem.

– Perdão, mas há uma Universidade, parece…

– Há. Mas é apenas um edifício histórico para se provar que existiu D. Dinis, seu fundador.

– Mas aí, Santo Deus, não se estuda?

– Sim, estudam-se ciências que levam cinco anos a estudar – e que estão atrasadas vinte anos; – com excepção de uma, a teologia, que acabou há um século.

– E como é a organização dos estudos?

– O aluno, ao entrar, faz uma cortesia profunda ao lente; lê lá dentro um romance que traz na algibeira; e sai fazendo ao lente outra cortesia profunda. Se não fizer isto é reprovado.

– E tudo isso para quê?

– Para se ser bacharel – unia qualidade que se exige para tudo, e que se não respeita para coisa nenhuma.

– E a que chama a política, meu amigo? Tenho-lhe ouvido…

– A política é a ocupação dos ociosos, a ciência dos ignorantes, e a riqueza dos pobres.

– Reside em S. Bento…

– Um santo do calendário?

– Uma sala que a Carta instituiu para perpetuamente se discutir quem há-de organizar o País definitivamente.

– E qual é a posição dos deputados?…

– Na aparência sentados, por dentro de cócoras.

– Perdão…

– Ah sim! a posição para com o Governo? Empregados de confiança do Governo, nomeados pelo Governo; – consentindo-se ao povo, para o contentar, que assine o decreto!

– É extraordinário! E o bom senso, não o há?

– Evita-se: porque tê-lo chama-se pedantismo, e publicá-lo chama-se insulto.

– Mas esse povo nunca se revolta?

– O povo às vezes tem-se revoltado por conta alheia. Por conta própria – nunca.

– Em resumo, qual é a sua opinião sobre Portugal?

– Um país geralmente corrompido – em que aqueles mesmos que sofrem não se indignam por sofrer. De resto a Pátria do grande Afonso de Albuquerque e de outros.

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O Homem Que Lê

Fotografias: João Martins Pereira

O HOMEM QUE LÊ

Eu lia há muito. Desde que esta tarde
com o seu ruído de chuva chegou às janelas.
Abstraí-me do vento lá fora:
o meu livro era difícil.
Olhei as suas páginas como rostos
que se ensombram pela profunda reflexão
e em redor da minha leitura parava o tempo. —
De repente sobre as páginas lançou-se uma luz
e em vez da tímida confusão de palavras
estava: tarde, tarde… em todas elas.
Não olho ainda para fora, mas rasgam-se já
as longas linhas, e as palavras rolam
dos seus fios, para onde elas querem.
Então sei: sobre os jardins
transbordantes, radiantes, abriram-se os céus;
o sol deve ter surgido de novo. —
E agora cai a noite de Verão, até onde a vista alcança:
o que está disperso ordena-se em poucos grupos,
obscuramente, pelos longos caminhos vão pessoas
e estranhamente longe, como se significasse algo mais,
ouve-se o pouco que ainda acontece.

E quando agora levantar os olhos deste livro,
nada será estranho, tudo grande.
Aí fora existe o que vivo dentro de mim
e aqui e mais além nada tem fronteiras;
apenas me entreteço mais ainda com ele
quando o meu olhar se adapta às coisas
e à grave simplicidade das multidões, —
então a terra cresce acima de si mesma.
E parece que abarca todo o céu:
a primeira estrela é como a última casa.

Rainer-Marie Rilke

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Oscar Niemeyer (1907 – 2012)

Óscar Niemeyer, In Memoriam

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O arquitecto Oscar Niemeyer morreu na noite de quarta-feira, aos 104 anos no Rio de Janeiro. Centenas de obituários, dezenas de homenagens, exposições e retrospectivas, livros, ensaios e cátedras multiplicar-se-ão pelo mundo.

De Paris e do trabalho com Le Corbusier, a NY onde projectou a sede das ONU, à Brasilia, cidade  saída da sua prancheta, a Niterói e ao Museu de Arte Moderna, a todo o seu amado Brasil, e aos lugares do Mundo onde espalhou o seu talento feito traço curvo.

O Brasil, a Arte, a Humanidade perderam um génio maior.

E quem melhor para homenagear Niemeyer que o próprio Oscar, com palavras e esquiços. R.I.P.

Niemeyer por Óscar

Auto-retrato

“Diria que sou um ser humano como outro qualquer – que nasceu, viveu e morreu. Sou um homem comum – que trabalhou como todos os outros. Passou a vida debruçado sobre uma prancheta. Interessou-se pelos mais pobres. Amou os amigos e a família. Nada de especial. Não tenho nada de extraordinário. É ridículo esse negócio de se dar importância”

Paixão pelo desenho

“Eu tinha 5, 7 anos e ficava desenhando com o dedo no ar. Minha mãe perguntava: ‘menino, o que você está fazendo’? Estou desenhando. Eu gosto de desenhar figuras. Eu faço uma escultura, eu desenho no ar. Eu faço um desenho e construo ele no ar”

Projeto de um estádio para a Copa de 2014

“Eu ia seguir o conselho de João Saldanha. O estádio tem que ser mais vertical, para aproximar o público mais do campo. Ia ser bonito, ia ser confortável. Tem que criar uma surpresa, tem que ter emoção e ser uma obra de arte”

Comunismo

“Fui sempre um revoltado. Da família católica eu esquecera os velhos preconceitos, e o mundo parecia-me injusto, inaceitável. Entrei para o partido comunista, abraçado pelo pensamento de Marx que sigo até hoje”

Conjunto da Pampulha

“Era um protesto que eu levava como arquiteto, de cobrir a igreja da Pampulha de curvas, das curvas mais variadas, essa intenção de contestar a arquitetura retilínea que então predominava”

Curvas

“Não é o ângulo reto que me atrai. Nem a linha reta, dura, inflexível criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual. A curva que encontro nas montanhas do meu país. No curso sinuoso dos sentidos, nas nuvens do céu. No corpo da mulher preferida. De curvas é feito todo o universo”

A vida

“A vida é um sopro, um minuto. A gente nasce, morre. O ser humano é um ser completamente abandonado…”

Solidariedade

“A vida não é justa. E o que justifica esse nosso curto passeio é a solidariedade”

Dinheiro

“Meu avô, que foi ministro do Supremo Tribunal, morreu sem um tostão. Achei bonito ele morrer assim. Já disse que teria vergonha de ser um homem rico. Considero o dinheiro uma coisa sórdida”

Brasília

“Nós começávamos a imaginar quando é que Brasília iria surgir. De repente, aparecia uma mancha azul no horizonte. Ela ia crescendo. Depois apareciam os contornos e começávamos a dizer: ali é o Teatro, lá é o Congresso, a Torre. Brasília surgia como num passe de mágica, um milagre”

Medo de avião

“Valeu a pena vir até do Rio de Janeiro a Brasília de carro, era quase uma obrigação vir aqui” (apos viajar mais de 11 horas de carro, para ir do Rio a Brasília, aos 101 anos)

Projetos de igrejas

“As pessoas se espantam pelo fato de, mesmo sendo comunista, me interessar pelas igrejas. E a coisa é tão natural. Eu morava com meus avós, que eram religiosos. Tinha até missa na minha casa. E eu fui criado num clima assim. Esse passado junto da família me deixou com a ideia de que os católicos são bons, que querem melhorar a vida e fazer um mundo melhor”

Sambódromo

“O Sambódromo é uma obra que quase dispensa explicação. Tem uma avenida central, que tem 700 metros e tem uma arquibancada dos dois lados. Então o importante é que funcione bem, que a visibilidade seja perfeita”

Centenário

“Cem anos é uma bobagem, depois dos 70 a gente começa a se despedir dos amigos. O que vale é a vida inteira, cada minuto também, e acho que passei bem por ela”

Arquitetura

“O que nós queremos na arquitetura, com a mudança na sociedade, não é nada especial. As casas de luxo serão menores. Os grandes empreendimentos urbanos, os cassinos, os teatros, os museus. Tudo isso será maior ainda porque todos deles poderão participar. Não basta fazer uma cidade moderna. É preciso mudar a sociedade”

Traços

“Faço arquitetura que me agrada, uma arquitetura ligada às minhas raízes e ao meu país”

Diferença

“Minha preocupação sempre é fazer uma coisa diferente, que provoque surpresa”

Pessimismo

“Sou pessimista diante da idéia de que o homem, quando nasce, já começa a morrer, como notou Jean Paul Sartre. Mas, na vida, caminhamos rindo e chorando o tempo todo: é preciso, então, aproveitar o lado bom da vida, usufruir o melhor possível e aceitar os outros como eles são. Sempre digo: o importante é o homem sentir como é insignificante, é o homem olhar para o céu e ver como somos pequeninos. Ultimamente, no entanto, tenho me espantado como a inteligência do homem é fantástica! Tenho conversado sobre astronomia. Como é imprevisível o que ele pode criar!”

Mude !


Fotografia: João Martins Pereira (Rajasthan, India)

Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa. Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair, procure andar pelo outro lado da rua. Depois, mude de caminho, ande por outras ruas, calmamente, observando com atenção os lugares por onde você passa.
Tome outros ônibus.

Mude por uns tempos o estilo das roupas. Dê os seus sapatos velhos. Procure andar descalço alguns dias. Tire uma tarde inteira para passear livremente na praia, ou no parque, e ouvir o canto dos passarinhos.
Veja o mundo de outras perspectivas.

Abra e feche as gavetas e portas com a mão esquerda. Durma no outro lado da cama… Depois, procure dormir em outras camas. Assista a outros programas de tv, compre outros jornais… leia outros livros.
Viva outros romances.

Não faça do hábito um estilo de vida. Ame a novidade. Durma mais tarde. Durma mais cedo.
Aprenda uma palavra nova por dia numa outra língua.
Corrija a postura.

Coma um pouco menos, escolha comidas diferentes, novos temperos, novas cores, novas delícias.
Tente o novo todo dia. O novo lado, o novo método, o novo sabor, o novo jeito, o novo prazer, o novo amor.

A nova vida. Tente. Busque novos amigos. Tente novos amores. Faça novas relações.
Almoce em outros locais, vá a outros restaurantes, tome outro tipo de bebida, compre pão em outra padaria.
Almoce mais cedo, jante mais tarde ou vice-versa.

Escolha outro mercado… outra marca de sabonete, outro creme dental… Tome banho em novos horários.
Use canetas de outras cores. Vá passear em outros lugares.
Ame muito, cada vez mais, de modos diferentes.

Troque de bolsa, de carteira, de malas, troque de carro, compre novos óculos, escreva outras poesias.
Jogue os velhos relógios, quebre delicadamente esses horrorosos despertadores.
Abra conta em outro banco. Vá a outros cinemas, outros cabeleireiros, outros teatros, visite novos museus.
Mude.

Lembre-se de que a Vida é uma só. E pense seriamente em arrumar um outro emprego, uma nova ocupação, um trabalho mais light, mais prazeroso, mais digno, mais humano.
Se você não encontrar razões para ser livre, invente-as. Seja criativo.

E aproveite para fazer uma viagem despretensiosa, longa, se possível sem destino. Experimente coisas novas. Troque novamente. Mude, de novo.
Experimente outra vez.

Você certamente conhecerá coisas melhores e coisas piores do que as já conhecidas, mas não é isso o que importa. O mais importante é a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia. Só o que está morto não muda !

Repito por pura alegria de viver: a salvação é pelo risco, sem o qual a vida não
vale a pena!

Edson Marques

Bloco de Cotas

O Bloco de Cotas é um blog que acompanho com regularidade e muito interesse.

Junta belos textos de autor (intimistas e inspirados, uns, atentos e críticos, outros) a preciosas referências na área da fotografia, das artes plásticas e gráficas, da música.

As propostas do Bloco têm-me proporcionado excelentes descobertas e aqui confesso, despudoradamente, pistas irrecusáveis para alguns dos meus próprios posts.

Eu, no inevitável caminho que percorro entre cota e velho, viro diariamente a folha do Bloco, atrasando a marcha do tempo.

O autor descreve-o assim:

Bloco de cotas ! Um olhar pela vida que é infelizmente é demasiado rápida, bem mais do que gostaríamos e que só agora que aqui chegamos realmente a olhamos com olhos de ver e o sentimento é esse mesmo; demasiado rápido!

Aqui partilham-se banalidades e nada mais, um partilhar de experiências que por tão diferentes que possam por vezes parecer no fundo apenas nos provam que realmente temos mais coisas em comum do que aquilo que pensamos.

O cota de hoje é o velho de ontem apenas com uma diferença, o velho de ontem era alguém lá pelos sessenta e tais enquanto que o cota de hoje é o gajo que anda pelos quarenta! Já tá ultrapassado, não “entende” a juventude, se tem o azar de perder o emprego já é velho para arranjar outro, se está separado não pode olhar para o uma gaja mais nova sem ser logo apontado como um tarado; enfim ser cota hoje em dia é lixado!

Este país não é mesmo para cotas!”

Michal Chelbin

Michal Chelbin é uma fotógrafa israelita que durante 3 anos, entre 2008 e 2010, fotografou prisões na Rússia e na Ucrânia.

Ao projecto. desenvolvido em conjunto com o marido e co-produtor Oded Plotnizki, chamou Sailboats and Swans e o resultado não deixa ninguem indiferentes, dada a força perturbante das imagens.

Com a devida vénia e crédito de autoria, transcrevo excertos da apresentação do projecto, um texto de Alissa Ambrose publicado no Light Box, um blog do departamento de fotografia da revista TIME.

“What does prison look like?

The pair used a network of connections, built over the 10 years they have worked in the region, to gain incredibly rare access to these facilities. What they found inside surprised them. Instead of grey concrete and steel, there were tropical wallpapers, lace-covered tables and furniture painted in glossy blues and greens. The prisoners in Chelbin’s photographs are not dressed in orange jumpsuits, but the floral housedresses, cloth jackets and rubber sandals common to village life in the region. Religious icons seem as ubiquitous as tattoos.

A mensagem de Michal Chelbin é cruamente lúcida e arrepiante –

“I want people to look at the book and see themselves,” said Chelbin. “The circumstances of life could have brought anyone to this place.”

“It’s something I look for in their faces, their gaze,” Chelbin said, adding that it was intuition, rather than any specific characteristics, that guided their choices. “It’s not a formula. Some people have this quality that you can’t take them out of your head,” Plotnizki added.

With only one day to work in each location, Chelbin and Plotnizki carefully explored these strange environments, quietly combing halls and common areas to find subjects for their portraits.

The mood in each location varied widely. Chelbin and Plotnizki described the tense atmosphere of a young boys’ facility as a “living hell, ” while the residents of a men’s prison “were like zombies.”

But it was a prison for women and children in Ukraine that made the greatest emotional impact on Chelbin, who herself had two young children at the time of the shoot. In one frame from that facility, a nursery attendant dressed in white is pictured leaning on the corner of an oversized crib. Inside, toddlers play with rubber balls that mirror the bright, primary colors of a mural painted on wall behind them.

The tired, distant expression of the attendant, whose name is Vika, is the only clue that this isn’t a happy scene. The children, we learn from Chelbin, were born in prison and have never known the outside world. Vika herself is a prisoner–charged with murder. She is also a mother, but cannot visit her own child who has been placed in an orphanage.

Chelbin chose not to ask each prisoner about their crimes until after their portrait sessions. Likewise, in the soon-to-be-released book of this work, captions containing the names and criminal charges of each prisoner are left to the last pages. In this way, viewers do not immediately know that a pair of sisters in matching dresses are in custody for violence and theft, or that a young man, reclining on a green iron bed, has been charged with murder.

There are a huge variety of faces in these portraits. There are young girls with pale, delicate skin and older women whose features are made severe with heavy makeup. There are boys so small they look more suited to grade school than prison and men whose scars indicate years of hard living. In all of them, though, there is a sense of dignity.

Bitaites

O Bitaites é, no dizer dos seus autores, um blog “para pequenos e médios intelectuais“.

Eu acrescentaria os grandes intelectuais e os desintelectuais (ou, talvez, os inintelectuais) porque o Bitaites é um espaço magnífico de informação, humor, opinião, divulgação, crítica e referência sobre a actualidade, que todos deviam ver, alimentado ao correr da inspiração, dos gostos e da oportunidade dos seus autores.

Imperdível !

Quem manda Bitaites –

Marco Santos

e Rui Eduardo Paes