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Amanhecer

O que será ser só
Quando outro dia amanhecer?
Será recomeçar?
Será ser livre sem querer?

(Chico Buarque)

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Fotografia: JMPhoto

Fez – Souk dos Curtumes

Estou em Fes-el-Bali, a Velha Fez. A cidade medieval,qualificada como Patrimônio Mundial pela Unesco, é uma das mais bem preservadas da África do Norte. Suas vielas intrincadas e seus labirintos estonteantes fazem com que apenas pessoas e burricos (e algumas insolentes motos) possam trafegar pelos estreitos caminhos. Com mais de 150 mil habitantes, a medina amuralhada, a Velha Fez, pode ser considerada como o maior distrito sem tráfego de carros do mundo.

Fez possui outros superlativos. Fundada ao redor dos anos 800, a capital espiritual e cultural do Marrocos alberga a mais antiga universidade da planeta, Al Karaouine. No século XII, durante a dinastia dos Almoadas (que então dominavam o sul da penínsulaibérica), Fez floresceu como polo comercial e, com seus 200 mil habitantes, teria sido a maior metrópole do planeta na ocasião.

Caminho pelas mesmas ruelas da medina que há 30 anos e não vejo muita diferença – a não ser algumas irritantes motos. Quando passo por Derb Chouwara, sinto um cheiro familiar,embora desagradável: uma mistura de ácidos e elementos putrefatos. Este odor penetrante me dá a certeza de onde estou: o bairro do curtume!

O melhor ponto de vista para observar o trabalho dos artesãos do couro é do alto de qualquer prédio que circunde o espaço. Estrategicamente, os comerciantes que vendem produtos decouro adquiriram quase todos os imóveis na redondeza.Aproveitando da curiosidade nata do turista, os comerciantes convidam o visitante a entrar na loja e subir até o último andar, onde terão a melhor vista – de verdade – dos poços onde o couro é curtido e tingido. (Depois da visita. é hora da venda e da barganha.)

O espetáculo é extraordinário. Três grandes quadriláteros (em forma de um L) comportam mais de 300 poços circulares. Em cada reservatório, de cerca de um metro de profundidade, há um líquido de uma cor diferente. A grande maioria tem a coloração marrom, em suas mais diversas matizes. Um terço do espaçocontem uma poção esbranquiçada. Alguns poucos, que chamam logo a atenção, possuem dentro uma tinta vermelha ou amarela. Difícil saber por onde começo a fotografar…

As peles dos diversos animais – cabra, ovelha, vaca e até camelo – passam primeiro pelas tinas esbranquiçadas, onde uma mistura de cal – com excrementos de pombas e urina de vaca –amolecem o couro e destroem os pelos dos bichos. Após ficarem de molho durante vários dias, as peças passam por um processo de limpeza e de enxague.

Até algumas décadas, o tingimento era feito com colorantes vegetais. Para o amarelo usava-se o açafrão-da-terra (cúrcuma ou turmérico), para o vermelho a papoula, para o azul o índigodos tuaregues e para o preto o antimônio. Mas hoje, os corantes industrializados tomaram conta do mercado, mesmo se os marroquinos preferem negar a mudança. Uma vez tingidos, os couros são, então, expostos ao sol para secagem.

Texto: Haroldo de Castro, Revista Época
Fotografias: JMPhoto


  • Deserto

    deserto

    “Oh that the desert were my dwelling place,
    With only one fair spirit for my minster.
    That I might forget the human race,
    And hating no one, love her only.”

    Lord Byron

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    deserto

    Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
    Não são algumas toneladas de pedras ou tijolos ao alto
    Que disfarçam o solo, o tal solo que é tudo.
    Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes
    Desertas porque não passa por elas senão elas mesmas,
    Grandes porque de ali se vê tudo, e tudo morreu.

    (Excerto) Alvaro de Campos

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    deserto

    Fotografias: JMPhoto

    O Homem que Lê

    20140620_00146Ascot, Inglaterra

    esquinas_vida08Berlin, Alemanha

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    Praga, República Checa

    O Homem que Lê

    Eu lia há muito. Desde que esta tarde com o seu ruído de chuva chegou às janelas. Abstraí-me do vento lá fora: o meu livro era difícil. Olhei as suas páginas como rostos que se ensombram pela profunda reflexão e em redor da minha leitura parava o tempo. — De repente sobre as páginas lançou-se uma luz e em vez da tímida confusão de palavras estava: tarde, tarde… em todas elas. Não olho ainda para fora, mas rasgam-se já as longas linhas, e as palavras rolam dos seus fios, para onde elas querem. Então sei: sobre os jardins transbordantes, radiantes, abriram-se os céus; o sol deve ter surgido de novo. — E agora cai a noite de Verão, até onde a vista alcança: o que está disperso ordena-se em poucos grupos, obscuramente, pelos longos caminhos vão pessoas e estranhamente longe, como se significasse algo mais, ouve-se o pouco que ainda acontece.

    E quando agora levantar os olhos deste livro, nada será estranho, tudo grande. Aí fora existe o que vivo dentro de mim e aqui e mais além nada tem fronteiras; apenas me entreteço mais ainda com ele quando o meu olhar se adapta às coisas e à grave simplicidade das multidões, — então a terra cresce acima de si mesma. E parece que abarca todo o céu: a primeira estrela é como a última casa.

    vietnam16Hanói, Vietnam

    esquinas_vida28Merzouga, Marrocos

    20130512_00237Jerusalem, Israel

    Andanas - BudapesteBudapeste, Hungria

    butao_16Paro, Butão

    esquinas_vida01Panama City, Panama

    81_20120412_01258New Delhi, India

    14_20111204_000402Lalibella, Etiópia

    Poema: Rainer Maria Rilke, in “O Livro das Imagens”, trad de Maria João Costa Pereira

    Fotografias: João Martins Pereira

    Espelho meu

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    Souk
    Marrakech
    Marrocos

    Fotografia: João Martins Pereira

    Jemaa el-Fna

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    Praça Jemaa el-Fna
    Marrakesh

    Fotografia: João Martins Pereira

    Hoje é o meu aniversário

    E, mesmo não sendo muito dado a celebrações ou efemérides, vou assinalar a passagem dos meus 55 anos com algumas imagens minhas que pretendem simbolizar a minha paixão pela Viagem (segundo a liturgia de Rimbaud, Amelia Earhart, Bruce Chatwin ou Paul Theroux) e, claro, pela Fotografia.

    Aqui fica uma pequena volta ao mundo pelos meus olhos, com passagem por Marrocos, Botswana, Islândia, China, Nepal, Tanzânia, Senegal, India, Butão, Líbia e Maldivas.

    Viajem comigo hoje !

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    Fotografias : João Martins Pereira

    Sahara

    “Ao longo dos anos vagabundos, o olhar céptico habitua-se às cores mais brilhantes e aos cenários mais estranhos. Acaba por descobrir a mais decepcionante monotonia da terra e a semelhança de todos os seres – e trata-se de um dos mais profundos desencantos da vida.

    No entanto, há recantos no Mundo que se mantêm intactos: só eles podem devolver às almas exaustas o frémito de que se julgavam desapossadas para sempre”
    (Isabelle Eberhardt, 1877-1904)

    “I have always loved the desert. One sits down on a desert sand dune, sees nothing, hears nothing. Yet through the silence something throbs, and gleams…”
    (Saint-Exupéry, O Principezinho)

    “The desert, when the sun comes up…I couldn’t tell where heaven stopped and the Earth began.”
    (Tom Hanks)

    “In the Desert of Life the Wise Person Travels by Caravan, while the Fool Prefers to Travel Alone.”
    (Provérbio Árabe)

    Fotografias: João Martins Pereira

    Livros – I

     

    A era digital trouxe-nos facilidades, possibilidades, comodidades, versatilidades que, até há poucos anos, eram inimagináveis.

    A maravilha que é poder disparar sem preocupações de quantidade de filme disponível, poder ver imediatamente o resultado de optar, testar e afinar enquadramentos, luzes, focos, exposições, trouxeram-nos para outra dimensão.

    Antes, a preparação de uma sessão de fotografia, para mais se fosse em viagem, obrigava a preparação prévia e atenta – será que lá há rolos em boas condições ? – e a uma gestão parcimoniosa do material disponível – quantas vezes andámos a poupar disparos porque os rolos estavam a acabar ?

    Por outro lado, as opções eram limitadas, logo à partida, pela escolha da sensibilidade do filme. O mais prudente era optar pelo todo-o-terreno, o confiável rolo de 36 fotografias a 200 ASA. E, a partir daí, era procurar o melhor compromisso com as condições de luz existente. No escuro, claro, porque o resultado só se veria muito depois.

    Mas se hoje já não podemos (nem queremos) prescindir destas vantagens, a verdade é que o digital também nos levou algum do romantismo e do mistério da fotografia.

    Logo à partida, pelo período de revelação. Aqueles dias entre o  regresso de viagem e a saída da porta do laboratório com um monte de envelopes de papel com provas 10×15, em papel mate, ainda a cheirar a impressão fresca, eram intermináveis. E quantas desilusões tivemos quando o resultado impresso não correspondia à memória do nosso olhar ? Mas, também, quantas emoções revivemos ao ver, uma a uma – primeiro em sucessão rápida, depois com atenção dedicada – cada imagem, cada memória impressa em papel ?

    Depois, pelo suporte. Hoje, pela quantidade de imagens que fazemos e pela universalidade dos meios de consulta, partilha e acesso, recorremos sistematicamente ao suporte digital.

    Para mim, contudo, a fotografia continua a ser papel impresso.

    Por isso, procurei encontrar uma solução para poder ter algumas imagens reunidas em papel. Contudo, a edição de livros convencionais, sem patrocínios e sem garantia de viabilidade comercial, depressa se revelou um projecto financeiramente inviável.

    Foi então que, um dia, o Zé Vera, me falou da Blurb, um ovo que deixaria o próprio Colombo perplexo.

    A Blurb é no fundo uma editora personalizada, onde compomos o nosso próprio livro e o editamos em quantidades mínimas, começando no exemplar único, e qualidade tipográfica irrepreensível. É, também, uma loja digital onde podemos colocar os nossos livros à venda.

    No fundo, a maneira de nós, os comuns mortais, podermos ter os  livros publicados.

    Já fiz alguns (capas acima), que podem ser vistos na loja on-line da Blurb, aqui .

    Divirtam-se !